JOÃO VITOR
Entrevistas com jovens
JOÃO VITOR, UM ESTUDANTE
Vestibular é a meta de grande parte dos estudantes brasileiros. É a passagem que marca a conclusão do Ensino Médio, e a possibilidade de ingressar em uma universidade. Na realidade de nosso país, alcançar o exame vestibular já pode significar desafio e superação. Obstáculos como dificuldade financeira, necessidade de trabalhar, preparo educacional insuficiente, barram a chegada de muitos de nossos estudantes a este patamar.
O que dizer então de João Vitor, 19 anos, um rapaz que está prestando vestibular em uma universidade em Curitiba, decidido a cursar Educação Física e que tem o que para muitos poderia ser considerado um obstáculo considerável?
João Vitor tem Síndrome de Down. O que não o impediu de, depois de seus dois primeiros anos de vida na Apae, estudar sempre em escolas regulares. Mariaté, Gente Alegre, Integral, escolas que tiveram João entre seus alunos. E que se adaptaram a ele, buscaram alternativas para potencializar seu aprendizado. No percurso, teve a ajuda de uma psicopedagoga, mais tarde de uma pedagoga, e no último ano do Ensino Fundamental, a presença de um professor auxiliar em sala. O Ensino Médio foi realizado através do programa CEEBJA (Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos), onde conviveu com pessoas com e sem dificuldades de aprendizagem, na mesma escola em que cursou o Fundamental. A fonoaudióloga foi entrando na família quando João Vitor tinha 3 anos, liberou o rapazinho quando tinha 8 anos porque já se comunicava bem, e retomou o trabalho em 2000, quando iniciaram a aplicação do PEI (Programa de Enriquecimento Instrumental), concluído recentemente. A mãe e o pai acreditaram desde o início no potencial do filho, investiram na autonomia e adequação social, cobraram dele sempre o que ele podia dar, sem subestimar suas capacidades, mas sempre o desafiando a ir mais a frente.
O resultado deste caminho acadêmico não deveria surpreender, deveria ser natural imaginar que ele mereceria passar no vestibular. Mas surpreende, emociona e confirma o potencial positivo das pessoas com Síndrome de Down: João Vitor Silvério passou no vestibular de Educação Física!
João explica tranquilamente a sua Síndrome: "Quando nasci de minha mãe, vim com um cromossomo a mais. Mas hoje nem parece que tenho Síndrome de Down. Sou como todas as pessoas. Quando eu perguntava para minha mãe porque eu tinha nascido com a Síndrome ou falava para ela que não queria ter SD, ela dizia que eu não era diferente dos outros. Diferente é o tempo que levo para fazer as coisas. Meu amigo terminava a fita de vídeo-game antes de mim, eu demorava mais, mas também terminava".
O que João acha da escola: "Acho que até a 5ª série foi fácil, depois ficou mais difícil. Mas eu fui conseguindo tudo. Para muitas pessoas já é difícil terminar o Ensino Médio, imagina passar no vestibular! Acho que fazer vestibular já é uma vitória. Mas com pensamento positivo, quem sabe eu passo".
Sobre as atividades de João: "Eu pinto quadros, este talento veio da minha mãe. Adoro esportes, já fiz basquete, tênis, hipismo, natação. Quero fazer Educação Física porque quero trabalhar como professor de esportes para pessoas com deficiência mental, e depois como personal trainer".
A vida social de João: "Tenho os amigos da escola, e amigos do grupo da Igreja. Namoro a Marcela já faz 3 anos, mas a mãe dela não deixa ela sair muito. Nos conhecemos no grupo do PEI. Meus pais preferem que eu não saia muito também, por causa de más-companhias e drogas. Eu também acho melhor".
Sobre o futuro: "Quero ser professor de Educação Física, personal, e tenho pensado em ser padre. Pode ser que não dê certo, mas minha mãe me fala sempre que preciso tentar para saber se vou bem no que quero fazer. Não posso desistir sem tentar. Quero ser voluntário, para mostrar para as pessoas que não podem ter preconceito".
Após a entrevista, João Vitor recebeu um convite para participar comigo das palestras dirigidas aos médicos das maternidades de Curitiba sobre o potencial positivo das pessoas com SD. Ele aceitou na hora. Sorte nossa: ele vai poder fazer seu trabalho voluntário, e eu terei comigo a prova viva de que pessoas com SD são capazes de superar antigas barreiras.
João Vitor, parabéns por esta etapa alcançada.
Josiane Mayr Bibas
(Diretora Comunicações Associação Reviver Down)